Dias assim...(Há 87 anos)

 






    Depois de algum tempo fui ao arquivo público, em Maceió, em busca da elucidação de algumas dúvidas históricas sobre Santana do Ipanema. Por enquanto, nem tudo que eu desejava, encontrei. Entretanto, deparei-me com outras informações importantes que não procurava. Investigar a história é assim.

    Hoje, divulgarei notícias publicadas no Jornal de Alagoas, entre 30 de Julho e 02 de Agosto de 1938. No período tivemos o registro da festa da padroeira Sant’Ana, exposição pública das cabeças dos cangaceiros mortos e a posse de prefeito nomeado.

    Os vocábulos foram transcritos para o padrão atual e mantido o estilo da escrita jornalística da época.

Jornal de Alagoas, Maceió, segunda-feira, 01.08.1938


Jornal dos Municípios - Religião


Praça da Matriz, teve nome alterado para praça João Pessoa
 na década de 1930 e atualmente, praça Manoel Rodrigues da Rocha.


"(Santana, 01.08.1938) Festa a Senhora Sant'Ana. Iniciadas no dia 17 de julho, transcorreram revestidas de grande animação, as novenas a Senhora Sant'Ana, padroeira de Santana do Ipanema.

Como nos anos anteriores, as últimas seis noites, foram patrocinadas pelos seguintes noiteiros, na ordem seguinte:

Dia 20, "noite dos carreiros"; dia 21, "noite dos artistas"; dia 23, "noite dos negociantes"; dia 23, "noite dos solteiros"; dia 24, "поite dos casados" e por último, no dia 25, "noite do 2º Batalhão". Esta foi a mais comentada no meio católico, dado o relevo que decorreu o que lhe deu considerável preponderância entre as demais.

No dia 26, às 10h, teve lugar a missa solene e às 16h, a procissão que percorreu as ruas da cidade.

A festa foi abrilhantada pela filarmônica Santa Cecília, sob a regência do maestro José Ricardo Sobrinho(1919-1947), havendo, durante as noites de novenas várias diversões na praça João Pessoa (antiga da Matriz e atual praça Manoel Rodrigues da Rocha).

O dirigente das cerimônias religiosas, foi o Frei Boaventura. No período, o titular da paróquia era o cônego José Bulhões(1886-1952), que havia assumido a paróquia em 1917."

Altar-mor da igreja matriz em 1938

"Jornal dos Municípios - Cultura

(Santana, 01.08.1938) Vamos ter cinema. Até que, afinal, parece que Santana vai dar mais um passo em seu progresso com a criação de um cinema, o que, aliás, era mais que um absurdo não o possuir ainda. Tão importante iniciativa é tomada agora pelo Sr. J. T. de Aquino, - leia-se João de Aquino Rocha - (1901-1984) alto fabricante de bebidas nesta cidade e que atualmente fez negociações para compra de um aparelho falado.

Os santanenses devem aplaudir e cooperar para a sua realização a fim de que o seu ideal seja aureolado com o êxito preciso."

    Essa notícia é inédita para mim porque os registros oficiais dão conta de que somente em abril de 1949 foi inaugurado o Cine Ipanema, de propriedade do senhor Zé Francisco Filho (1921-1975)."

Jornal de Alagoas, Maceió, domingo, 31.01.1938


"Fim do Cangaço - Chegam a Santana as cabeças dos bandidos

(Santana, 30.07.1938) Conduzidas por quatro automóveis e três caminhões, chegaram às 18h as cabeças de nove bandidos e duas bandidas.

Grande massa popular esperava a caravana de automóveis, no maior entusiasmo.

A tropa que dizimou o grupo Lampião não veio completa, estando ferido um soldado.

Exposição das cabeças dos cangaceiros na sede do Batalhão

O tenente coronel Lucena, tenente João Bezerra e aspirante Ferreira chegaram acompanhando os despojos.

O soldado José Araújo Correia conduzia 2 bornais enfeitados, uma cartucheira e um apito pertencente a Lampião, como também o fuzil de Luiz Pedro.

O soldado Arthur Rodrigues dos Santos conduzia um bornal pertencente ao chefe de grupo Luiz Pedro, bem como o parabélum de Lampião.

O soldado José Pereira trazia um chapéu pertencente a Lampião. Havia no chapéu com as iniciais C. L., pertencente a Lampião. Havia no chapéu 7 medalhas de ouro encravadas. Também conduzia ele um anel com o nome "Santinha" e duas inscrições: "Lembranças" e "Amizade". Trazia ainda o soldado José Pereira outro chapéu e três medalhas gravadas com os nomes "Amor", "Recordação" e "Amizade". As anteriormente enviadas estão confirmadas inteiramente.

Jornal de Alagoas, edição de 01.08.1938

Morreram mais quatro bandidos

(Santana, 30.07.1938) O bandido "Bolão", ferido no combate e foragido, revelou em Pão de Açúcar, onde foi dar, terem morrido mais quatro cangaceiros,

O coiteiro que entregou os bandidos ao tenente Bezerra chama-se Pedro Cândido.

A cabeça de Lampião, conservada em formol desde Piranhas, acha-se em bom estado, assim como a cabeça de Maria Déa e dos outros bandidos."



Política

"(Do correspondente, Santana, 30.07.1938) Chegada e posse do novo prefeito. Às 10h30min de hoje, a filarmônica desta cidade chegava à praça coronel Manoel Rodrigues, onde encontrou grande massa popular que estava à espera do novo Prefeito.

Às 11 horas, partiram diversos automóveis ao encontro da comitiva, em um dos quais seguiram o comandante do II Batalhão e demais autoridades locais.

Muito demorou o sinal anunciado, tornando-se impacientes os que estavam à espera da comitiva.

Finalmente, às 12h, ouve-se o espocar de dois foguetes - anunciando a aproximação. Poucos minutos decorreram e apresenta-se o primeiro carro, que é seguido por vários outros.

Ao chegar naquela praça, a comitiva foi recebida por girândolas de foguetes, palmas dos espectadores, ouvindo-se uma marcha da filarmônica. O cortejo passou e depois de percorrer as principais ruas da cidade, voltou à praça para receber os primeiros cumprimentos. Nesta ocasião discursa o comerciante Sr. Fernando Nepomuceno, que, em vibrante oração, enalteceu o júbilo dos santanenses diante de tão justo ato do interventor federal designar o sr. Pedro Rodrigues Gaia para prefeito deste município. O orador foi grandemente ovacionado."

Da esquerda para à direta: Ten. Francisco Ferreira de Mello, Ten. José Tenório Cavalcante,  Cel. Teodoreto e o prefeito nomeado de Santana do Ipanema Pedro Rodrigues Gaia, na grota de angicos no final de 1938. Fonte: Livro "Apagando Lampião".


"Em seguida, usa da palavra o 3º sargento ¹Oscar Silva, que, em nome dos sargentos do II Batalhão, apresentou as boas vindas ao novo prefeito e congratula-se com o povo santanense por sua nobre escolha para os seus destinos administrativos.

Depois, em nome da comitiva e do Prefeito ²Pedro Rodrigues Gaia, falou o sr. João Moraes, que depois de eloquente discurso rematou: "Ajudemos, senhores, aos homens de governo a construir a nossa pátria".

Às 13h, o ambiente de festividades transmudou para melhor com a faustosa notícia da morte do "Terror do Sertão", o famigerado bandoleiro Lampião, - que em companhia de 10 sequazes - salientando-se entre eles os famosos, Luiz Pedro e Ângelo Roque tombou sem vida diante da - tenaz perseguição de forças do II - Batalhão, sob o comando do tenente Bezerra.

Tal notícia procedente de Piranhas, foi transmitida pelo telégrafo ao sr. tenente-coronel José Lucena, que exultou de alegria. O entusiasmo foi demasiado. Falaram diversos oradores.

Às 15h, mais ou menos, teve lugar a posse. É lida por Antônio Bulhões, o relatório do Sr. Ormindo da Silva Barros, a sua gestão desde Novembro de 1937. O ex-prefeito, usando a palavra, faz um longo discurso e em seguida faz a entrega do cargo ao seu substituto, o Sr. Pedro Rodrigues Gaia. Lavrada e lida a ata pelo Sr. Sebastião Costa Barros, secretário da Prefeitura, depois de assinadas, foi encerrado o ato.

Discursaram ainda os Srs. José Pinto de Barros, pelo prefeito Pedro Gaia; João Moraes, o advogado dr. Manoel Duarte. Compareceram à solenidade o tenente-coronel José Lucena; pelo secretário de Fazenda, Dr. Augusto Pereira da Costa, Juiz de direito desta comarca; Sr. Francisco Cavalcante, prefeito de Palmeira dos Índios; o prefeito de Arapiraca; Valdemar S. Lima, tabelião de Palmeira dos Índios; vários oficiais e sargentos do II Batalhão; o representante do “Jornal de Alagoas” nesta cidade e o de Palmeira dos Índios; representantes da "Gazeta de Alagoas" de ambas as cidades e várias pessoas da alta classe social, além de grande massa popular.

O Sr. Ormindo da Silva Barros, ex-prefeito da cidade, foi conduzido à residência acompanhado do cortejo precedido pela Filarmônica Santa Cecília, sob a regência do maestro José Ricardo Sobrinho."


Agosto, 2025



Referência:
Jornal de Alagoas, edições de 1938. Acervo do Arquivo Público de Alagoas, Maceió;
¹Oscar Silva. Anos depois, deixou a polícia e ingressou no serviço público civil e se tornou um dos maiores escritores santanenses;
²Pedro Rodrigues Gaia, embora descendente do fundador de Santana do Ipanema residia em Palmeira dos Índios e veio tomar posse como 7º Prefeito Interventor.

Para saber mais clique aqui: Cortejo Macabro: cabeças dos cangaceiros percorrem vilas e cidades alagoanas e são expostas à visitação pública.

Comentários

  1. Mais um excelente resgate histórico, para socialização de conhecimentos sobre Santana

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  2. E assim vai passando a história, de geração em geração. Ao ler coisas assim do passado, tento transportar-me até lá. E penso, nos valores vigentes a época, valores morais, sociais, afetivos, os intrínsecos, e com certa sutileza os monetários. Os que sucumbiram e os que permanecem. Bom, muito bom. Parabéns! Confrade e amigo escritor João Neto Félix. ass: Fabio Campos.

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  3. Que beleza de pesquisa, Xará!!
    Foi atrás de uma coisa e encontrou outra muito interessante.
    Um mergulho em um passado não muito distante, mas revelador de uma época.
    Muito enriquecedora essa pesquisa.
    Parabéns, João de Liô!!

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  4. Boa noite Xará!
    Belo resgate!
    Parabéns pela pesquisa.
    João Neto Oliveira

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  5. Não há algo tão importante do que o conhecimento.Muito obrigado querido João Neto,por nos trazer sempre grandes conhecimento da nossa história a qual nos faz entender como chegamos até aqui. Risomar Oliveira.

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